(para todos os que contam um dia ver este magnífico filme não leiam o que se segue; não passam de citações tiradas de múltiplas conversas, com muito mais sumo no contexto original...e invejo-vos, pois podem ver "O sabor da cereja" pela primeira vez...)
- Vês aquele buraco? Aquele, ali.
Agora, ouve com atenção.
Às 6 da manhã vem aqui e chama pelo meu nome duas vezes: "Sr. Badii, sr. Badii"
Se eu responder, pegas-me na mão para me ajudar a sair. E estão duzentos mil toman no carro; pegas neles e vais-te embora.
Se eu não responder, atira para cima de mim 20 pazadas de terra, pegas no dinheiro e vais-te.
...
Sei que a tua obrigação é pregar e guiar as pessoas, mas és muito novo, tens tempo para fazer isso depois.
É das tuas mãos que preciso. Não necessito da tua lingua ou da tua inteligência.
...
Decidi libertar-me desta vida...De nada te servia saber porquê e, aliás, não posso falar disso. E mesmo que te dissesse não perceberias. Mas não é por não perceberes, mas por não o poderes sentir. Podias sentir pena, compreender, mostrar compaixão, mas sentir a minha dor? Não. Tens os teus males e eu também...percebo-te e tu percebes que sofro, mas não o podes sentir.
...
Bem sei que o suicídio é um dos pecados mortais, mas não ser feliz também é um grande pecado, e quando estás infeliz magoas outras pessoas; não será também pecado? Magoares outros não será também pecado?
Magoares a tua família, os teus amigos, a ti próprio, não será pecado? Quer dizer, magoar-te não é pecado, mas magoar a mim já é?
...
Não tem mais perguntas?
- Se pudesse ajudar de outra forma, gostava muito mais.
Se um homem quer ajudar o seu próximo devia poder fazê-lo de outra maneira. Podia salvar uma vida. Não quero ser responsável pela morte de alguém, mas já que me pede isso digo-lhe que sim. Mas é difícil, admita que não é fácil. Se não explica os seus problemas, quem o pode ajudar?
Eu nunca o vi na vida.
Aqui à esquerda, se faz favor. É mais longe por aqui, mas a estrada é melhor e mais bonita.
Eu conto-lhe uma coisa que me aconteceu. Foi logo após ter-me casado.
Tivemos dificuldades de todo o género, e sentia-me tão farto que decidi acabar com a vida.
Uma manhã, antes do alvorecer, pus uma corda no automóvel. Estava resolvido, queria mesmo suicidar-me. E dirigi-me para Mianeh...Foi isto em 1960. Quando cheguei a umas plantações de amoras parei o carro. Ainda fazia escuro.
Lancei a corda a uma árvore, mas ela não ficou presa. Volto a tentar, uma, duas vezes, mas nada feito.
Por isso trepei à árvore, e atei bem a corda.
Foi quando senti uma coisa mole debaixo da mão...As amoras. Amoras deliciosamente doces. Comi uma; era suculenta. Depois uma segunda, uma terceira...De repente, notei que o Sol nascia atrás do cume da montanha.
Que Sol, que paisagem, que verdura!
Repentinamente, ouvi crianças que se dirigiam para a escola. Pararam para me olhar...Pediram-me que abanasse a árvore. Amoras tombaram, que elas comeram. Senti-me feliz...Depois apanhei umas tantas para levar para casa.
A minha mulher ainda dormia. E quando acordou, também ela comeu as amoras. Com enorme gosto, ela também.
Eu tinha saído de casa para me matar e voltado com amoras...Uma amora tinha-me salvo a vida.
Uma amora salvou-me a vida.
Não há ninguém que não tenha os seus problemas na vida. É como as coisas são, e há tanta gente na terra...É como as coisas são. Famílias sem problemas é coisa que não existe.
Desculpe tê-lo trazido por esta estrada tão pedregosa...Julgamos uma coisa boa, e depois vemos ter-nos enganado. O principal é pensar muito bem. Pensa-se que o que se faz é o certo, e depois apercebemo-nos que é o errado...
Aqui à esquerda, por favor.
...
Se não quer falar, falo eu.
Perdeu toda a esperança?
Nunca olhou o céu ao acordar de manhã?
Ao amanhecer nunca deseja ver o nascer do sol?
E o alaranjado e avermelhado do sol ao crepúsculo? Nunca mais os quer ver?
Já viu a lua?
Não lhe interessa ver as estrelas?
As noites de lua cheia, não as quer voltar a ver?
Quer assim tanto fechar os olhos?
Por favor, siga pela direita.
As almas do outro lado adoravam dar uma espreitadela a este, e você quer correr e ir para lá.
Não deseja voltar a beber a água de uma nascente? Ou lavar o rosto nessa água?
Para a direita.
Pense nas 4 estações, como cada uma produz frutos.
O Verão tem os seus frutos, o Outono também, o Inverno traz frutos diferentes e também a Primavera.
Mãe nenhuma pode encher o frigorífico com tantos frutos, para os filhos.
Mãe alguma faz pelos filhos o que faz Deus, pelas suas criaturas.
E quer recusar isso tudo?
Quer abdicar disso tudo?
Quer abdicar do sabor das cerejas?
Não faça isso, meu amigo, imploro-lho.
Mas se quiser faça.
Vire à direita.
Antes de descer, vou cantar-lhe uma canção em turco.
Significa ela:
Meu amor, vou levantar voo;
vem até mim.
Fui expulso do jardim do meu amigo;
vem até mim.
De dias felizes outrora, caí em tempos difíceis;
vem até mim...
Bom, nós mal nos conhecemos...
Mas vai, e eu sou seu amigo, fica, e sou seu amigo; em qualquer dos casos, eu sou seu amigo.
Fica, sou seu amigo, vai, e continuo a ser.
Adeus.
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